terça-feira, 18 de agosto de 2015

CONSADC organiza debate sobre a integracao regional por ocasiao do Dia da SADC

A XENOFOBIA (etimologicamente, ódio ao estrangeiro) é um obstáculo à almejada integração efectiva da Comunidade de Desenvolvimento da África Austral (SADC), segundo defendeu, sexta-feira, em Maputo, Manuel Guilherme Júnior, docente da Universidade Eduardo Mondlane, num debate por ocasião dos 35 anos de existência desta organização regional, que ontem se assinalaram.
Manuel Júnior, que falava na qualidade de um dos oradores do tema “Os desafios da integração da SADC até 2020”, promovido pela Comissão Nacional da SADC, falou de muitos outros factores que podem comprometer a integração efectiva do bloco e defendeu a necessidade de se transmitir ao cidadão a noção de que o outro não é estranho em cada um dos países que compõem a organização.
Na sua alocução, o académico referiu-se ao plano estratégico indicativo da SADC para o período 2015-2020, afirmando que o mesmo contém quatro prioridades, faz uma incursão aos factores que dificultaram a implementação do anterior, potencialidades da região e os desafios emergentes da integração.
Disse ter faltado uma planificação adequada do próprio processo de integração em 2008, quando já se sabia, por exemplo, que em 2010 entraria em vigor a união aduaneira. Manuel Jr. apontou, por outro lado, a fraqueza do próprio Secretariado Executivo da SADC, sob ponto de vista de poderes.
A propósito de poderes, disse que muitos poderes estão centrados na cimeira e noutros órgãos, quando alguns poderiam passar ao Secretariado Executivo. O académico afirmou que os estados-membros da SADC devem estar preparados para a transferência de parte da sua soberania para a organização.
Aludiu também aos instrumentos legislativos da organização, nomeadamente os 30 protocolos aprovados, mas que não vigoram até ao presente momento, porque ainda não foram domesticados.
No quadro das prioridades contidas no plano estratégico indicativo, Manuel Jr. referiu-se à industrialização. A este propósito, defendeu a necessidade de o bloco repensar na sua actuação relativamente a terceiros no que diz respeito aos investimentos estrangeiros realizados em cada um dos países membros, ou seja, a industrialização da SADC deve ser feita de forma conjunta.
Outra prioridade é relativamente a infra-estruturas. Neste domínio, defendeu a necessidade de realização dum esforço conjunto, por exemplo, no capítulo de construção de estradas para garantir a livre circulação de pessoas e bens.
No domínio da paz, afirmou que há indícios de que a região está bem, embora com alguns focos num e noutro país, a exemplo de Moçambique.
No que diz respeito ao desenvolvimento humano, destacou a necessidade de formação das pessoas para servirem a região e não somente ao seu país de origem. Para Manuel Jr., este é um grande desafio que deve ser enfrentado, na perspectiva de assegurar uma formação orientada para a especialização para a região, sendo a harmonização dos currículos um dos pressupostos fundamentais.
Disse que os países-membros da SADC precisam saber quais são as prioridades no âmbito do plano estratégico indicativo, para domesticarem as políticas aprovadas pela organização. O financiamento dos projectos é outro desafio apontado pelo académico, que defende que os estados-membros devem pensar no financiamento conjunto de projectos com impacto para a região.
“É preciso financiar infra-estruturas que permitem que o cidadão circule de Moçambique à Tanzania, ou à Zâmbia, etc.”, disse, observando, contudo, que não se pode pensar em resultados imediatos para o país neste processo de integração.
Também aludiu ao papel do tribunal da SADC, agora suspenso, como órgão que, segundo o orador, deve ser um órgão de resolução de diferendos. Defendeu, igualmente, a necessidade de se reavaliar o mecanismo de tomada de decisão na organização, afirmando que o actual modelo de unanimidade emperra muitos processos.
Manuel Jr. referiu-se, por outro lado, à necessidade do reforço do tratamento diferenciado entre os estados-membros. Na sua óptica, os estados-membros não devem ser tratados de forma igual, devendo os que estão mais na dianteira dos processos merecer um tratamento especial.
Sobre os recursos da região, defendeu a necessidade de se pensar na melhor forma de potenciá-los. Para o académico, há que encontrar padrões de exploração comum dos recursos, para permitir que os investimentos feitos num determinado país, como Moçambique, beneficiem a região.
“Há condições para fazermos muitas coisas antes de 2020, para a integração regional”, disse.
Por seu turno, Oksana Mandlate, investigadora, fez uma reflexão sobre a base produtiva e a industrialização na SADC, como prioridades. Segundo afirmou, há que salvaguardar alguns aspectos sobre o desenvolvimento do sector privado, de infra-estruturas e a industrialização.
Indicou que os benefícios não são distribuídos uniformemente quando se fala da integração regional. Sobre a industrialização, defendeu a necessidade de ter em conta o tipo de modelo de integração que se pretende induzir.
Para Oksana Mandlate, a integração regional só pode ser bem sucedida quando ela ocorrer a nível de cada país, em primeiro lugar. Referiu, por exemplo, que em Moçambique existem centros de produção e consumo com dificuldades de interagir entre si.
Afirmou que o sector privado é que provoca a industrialização e competitividade, realçando, porém, que a competitividade das empresas não depende somente das capacidades, mas também do ambiente económico que as rodeia.
“Se não temos um sector industrial bem desenvolvido, não se pode competir em pé de igualdade”, disse, acrescentando que o país precisa duma base produtiva alargada para resolver problemas sociais como a pobreza.
Entretanto, no debate do tema foram levantadas algumas questões cruciais no âmbito da integração da SADC. Airton José, do Ministério da Economia e Finanças, indicou, por exemplo, que o fundo de desenvolvimento regional está numa fase avançada para o financiamento de projectos que beneficiem a região, a exemplo de Mpandamkua, em Tete.
Airton José afirmou que a integração regional vai levar o seu tempo.
A professora Avelina Simbine referiu-se à balança comercial negativa de Moçambique e defendeu que antes de tudo o problema da fome deve ser resolvido, o que passa pela aposta na produção agrícola.
“Doa a quem doer, temos de trabalhar. Temos condições e pernas para andar. Caso contrário, passaremos o tempo a dizer que a África do Sul é isto, é aquilo”, disse.
In Jornal Notícias de 18-8-2015
 

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